sábado, 11 de setembro de 2010

No meu horizonte, uma estreita linha
Um mar com braços de amansar
Uma fina cortina que tranqüiliza
Escondendo feras avessas, presas num pesar

Tão longo que em sonhos descanso
À distância de um ombro meu
Tão eu quanto o desejo aceito
Matéria golpeada pela espada de Teseu

Uma fúria imensa silvando aos meus olhos
Sondando meu passo tropeçando de imediato
Desbaratando minha confusa e intrépida razão
Orientando meu fluxo para este regato

São pedaços juntos aos nós dos laços
São amores compartilhando companhias, beijos e afagos
É medo que surgindo do nada foge do reflexo no espelho
É meu sonho, neste horizonte, virando a matéria de fato

domingo, 11 de julho de 2010

No dia em que o juízo se fez faltoso
Uma brisa morna vasculhou o céu
Levantou aromas ainda risonhos
Despertando potestades ao toque do bedel

Quedou-se o mar de súbito
Enquanto os olhos teciam o efeito
Balbuciando o inicio de um texto
Que no silêncio, desabou sem ter jeito

Estouvada, como se por ópio fosse confundida
Esbarrei no abraço encontrando teu braço
Desfazendo-me sem receio ao pé do teu peito
Escorreguei no beijo, entregando-me ao leito.

Nesta lacônica e confusa situação
O ápice da obra destacou-se em prontidão
No proscénio, cercado de alma e de desejo
Sossegou o eleito com ébria satisfação

domingo, 27 de junho de 2010

Bailando incessantemente no meio fio
Foi quando minha dança sofreu um espasmo
Rodopiei e trancei meus pés
Enquanto olhos me contemplavam

A queda mostrou-se vertiginosa
Um vôo que não parecia ter fim
E a cada quadro que eu borrava
Sentia a vida fluindo em mim

Semblantes fitavam-me horrorizados
Outros, os ombros mostravam
Alguns fingiam interesse frio
Poucos escutavam os acordes escassos

A cada milésimo escorregadio
Entre meus dedos flutuava a parafina
Mas o chão, minha linha de chegada,
Parecia mais distante da minha finda sina

Minha fantasia desfazia-se
A cada simetria perdida
Esquecida do esmero que aprouve
Deixando de lado aquilo que não soube

Um estado perfeito atemporal
Onde o perder-me pareceu natural
Uma vírgula depois de uma longa frase
Meu sonho, esvaindo-se, num som gutural

Já não sou mais a menina
Nem a borboleta, nem a cantiga
E por mais que o figurino não mais sirva
A vermelha sapatilha ainda é a da bailarina

sexta-feira, 11 de junho de 2010

E no manejo da palavra
O coração se agita, aflito
Balbucia elementos tantos
Que nas mãos se faz dito

Caçador que a presa espreita
Tal qual presunção que se faz eleita
Desfaz o mito do meu pranto
Trazendo desfecho para o conto que me ajeita

Cada dor, cada palavra, cada batida
Impressão instigante que surge altiva
Cada frio, cada sítio, cada rio
Desbota na pele como num arrepio

Os olhos se inundam de sentimento
Refazendo o laço com esmero e atrevimento
Em meu peito o bem querer se aninha
Alastrando-se rapidamente feito erva daninha

quarta-feira, 12 de maio de 2010

E depois do emaranhado de toda uma vida
O fio da meada aparece como por encanto
De agora em diante, desfaço-me do manto
E do receio que me acompanhou por todo canto

Olhei muito mais profundamente como o de costume
Foi assim, então, que aconteceu
O fino véu que confundia minha visão
De um momento para o outro, cedeu

Minhas armas caíram

Era tudo tão simples, e muito complicado
De cores alvas, mas de sentido redobrado
Sem ligações com o ontem, ou amanhã
O hoje se faz mais sagrado que febre terçã

Finalmente a ligação se fez completa
Meu Eu e eu assumimos nossa relação
Configuro meus espaços do lado de fora
E encontro o tempo preso ao meu botão

Meu mundaréu pleno, minha população
Sorriu feliz diante da anunciação
O ato, de fato, mais que enquadrado
No murmúrio revelado em plena perfeição

Um espelho conservado, porém antigo
Um revés distraído de um mundo cão
Bateu asas e voltou para o ninho
Já tonto por conta de tanta ilusão

Meu limiar agora é um pouco brando
Não escancarado, tão pouco talhado a mão
Na claridade que agora me ausculta
Fecho os parênteses que abri sem intenção

Na simplicidade que o hoje me mostra
Vejo a realidade com estampas suaves
Sinto o tempo com generosas gafes
E revejo meu texto sem propor demora

domingo, 11 de abril de 2010

Míngua, míngua Lua
Vai, faz que te anula
Escancara a tua cara
E ilumina toda a rua

Renova, nova Lua
Extirpa a pele de cordeiro
E deixe que o lobo avesso
Pelo avesso se conclua

Cresce, louca Lua
Solta este dragão vermelho
Escorrendo todo teu receio
Pela sarjeta que flutua

Explode, cheia Lua
Incinera cada inércia minha
Que do meu suspiro aninha
A loucura que me usurpa

Transforma, ecoante Lua
Que de todo pensamento evaporado
Seja o coração exaltado
E que a ele o meu se una.

sexta-feira, 19 de março de 2010

A inocência que de súbito vejo no espelho
Mora nos olhos morenos manchados de mar
Desliza pela alva pele com explicito receio
E se escora nos lábios rosados ávidos por amar

Uma ausência de legendas mistura os sons
A ânsia pelo desconhecido enaltece os tons
O muro partido se frustra ao sonhar
Que um dia foi muro, mas vai agora agregar

A anatomia do abraço se esconde nas tablaturas
Ventrais se procuram, falanges que se afagam soturnas
Película infame que o interstício acumula
Fenômeno pulsante que o tempo apruma

A fortaleza em desejo desmancha em beijos
A bruma do sonho firma o feito
Em mim um estado presente mais que perfeito
No músculo involuntário a reação que encadeio

O verbo se perde em meio o trajeto
Os olhos se buscam na ânsia de parar o tempo
Extremidades se esbarram, não por desatento
Teu sorriso se alastra sorvendo meu silêncio

A fortaleza que por hora meus ais encerram
Desmancha como areia num presente ao qual velo
E esta nova onda que meu coração macera
Instala moradia nesta ilha de rumo certo

sexta-feira, 19 de fevereiro de 2010

Fechei a última porta do meu coração
E ainda levo a chave em minhas mãos
A tramela ainda aguarda
Que eu execute a sua função
A porta não mais fica aberta
Permitindo pelo batente
A passagem de quem não soletra
A mensagem que agora estampada está
Na porta que um dia foi aberta:

“Não estou fechada
Não estou cega nem demente
Somente de agora em diante
Que bata quem tem a chave, somente”

sexta-feira, 8 de janeiro de 2010

Vou juntar os pontos
E traçar meus encontros,
Conter minha alma buliçosa
Satisfazendo todo o encanto

Vou entrar num copo,
Numa garrafa, ou taça
E preencher todo espaço,
Por completo,
Ficar beirando a janela,
Aquela aberta,
E ver tudo como o certo.

Vou estender meus braços
E encontrar os mesmos e outros laços
Nem tão longe, nem tão perto
Mas de um jeito que eu sempre os encontre
Sem nunca perder o passo

Vou domar meus olhos ciganos
Que perdidos na fina retina
Vivem na busca da ilha perdida,
Uma rede longínqua,
O par de sandálias perdidas

Quero as mesmas perguntas com respostas diferentes
Quero ver o mundo mostrar seus dentes,
Olhos, bocas e adjacentes
Quero a foto, a moto, os óculos
Quero tudo dentro do meu foco.